Aurora arrumou o short curto no meio de suas pernas, enquanto saía mais uma vez do bar, agora com uma garrafa de água na mão, e o capacete na outra. Ela não sabia muito bem quais eram os planos de Sam, mas, ao encostar na parede à espera da Cinderella atrasada, seus pensamentos foram nos últimos dias.

Tudo o que não tinha dado certo nas primeiras vezes daquela relação, estava dando agora. Por um breve momento, ela pensou o quanto era engraçado como faltavam maturidade um ano atrás. Ela não entendia direito como 365 dias, uma moto e vários lugares do mundo podiam amadurecer tanto uma pessoa.

No entanto, ela era a prova viva daquilo.

E lá estava ela, recém-saída da pista mais uma vez. Os cabelos corriam junto com o vento, um leve sorriso tomando conta de seus lábios ao lembrar de tudo o que aconteceu ao levar ele a fazer o pedido que ela tanto queria ouvir mais uma vez. Antes que pudesse devagar demais, contudo, o barulho inesquecível daquele motor chegava cada vez mais perto, e em questão de segundos ele apareceu na sua frente. A aloirada levantou os braços, como se não entendesse o que tinha acontecido.

-As chaves, sei. -Deixou seu corpo ser levado pelas mãos do tatuado, e se apoiou em seus braços, dando outro selinho no mesmo logo em seguida. -Eu ia perguntar para onde estamos indo, mas você adora me torturar.

Deu de ombros e subiu na garupa da moto sem pensar duas vezes. Colocou o capacete na cabeça - mesmo ela odiando ter que usar aquilo - e entrelaçou os braços no tronco do homem à sua frente. Ela odiava surpresas.

***

O vento batia forte contra as pernas descobertas, e a paisagem fez a garota sorrir. Ela se soltou do maior, abrindo os braços e soltando um grito de alegria em sua garupa, mas ela sabia que não tinha assustado ele. O moreno estava acostumado com a loucura dela.

A jornalista não esperava que saíssem da cidade, mas a placa de adeus fez seu estômago revirar. Não por medo por ela odiar surpresas, mas sim de animação. Como uma pessoa que está no topo de uma montanha russa e está prestes a cair a toda velocidade. Esperou que ele estacionasse da moto para dar um pulo apressado, tirando o capacete e o deixando em cima do veículo. Rory tinha um sorriso de canto a canto, e seu corpo não conseguia parar quieto.

A garota pegou a mão do outro, e suas botas pisavam sobre a grama fofa. "Talvez a discussão com a editora e a semana de licença tenha servido para alguma coisa". Ao ver os cavalos, sua mão se soltou da dele, e como uma criança, ela correu para perto dos animais, sem assustá-los. Levou a mão para o que o homem tinha apresentado como Sol, acariciando o lado do seu rosto.

-Eu amo cavalos. Meu pai costumava levar eu e Vee para um estábulo de hipismo quando éramos mais novas. -Era verdade, ela era realmente boa naquilo. Ao contrário da sua irmã, a garota não participou de competições, mas sabia cavalgar tão bem quanto ela. Levou os braços ao pescoço do tatuado, colando seus lábios aos dele em um beijo calmo. O encerrou com um selinho logo em seguida, mexendo nos curtos fios de cabelo. -Notei, até nos tirou de dentro da cidade.

Aurora levantou a mão, como se agradecesse mas ao mesmo tempo recusasse a ajuda. Levou a mão direita para o local onde segurava na cela, apoiou o pé também direito e se propulsionou para cima, levantando a perna esquerda até o outro lado do animal, que deu alguns passinhos ao sentir o peso em suas costas. A mão livre acariciou os longos cabelos brancos.

-Vamos ver se é só moto que esse carinha sabe usar. -A loira esperou o outro montar com um meio sorriso no rosto. -Vamos fazer eles comerem poeira, Sol!

Fez um barulho de beijo e segurou as rédeas, começando calmo, e logo depois passando para trotes longos. Os cabelos loiros voavam junto ao vento, e a garota não diminuiu seu passo por um segundo sequer. Naquele breve momento, era ela, Sol, o vento e as lembranças de seu pai lhe ensinando a cavalgar. Graças à ele agora podia fazer aquilo com seu namorado.

Namorado.

A jornalista abriu um largo sorriso, e olhou para sua diagonal traseira esquerda, olhando para o moreno. Deu uma risada e diminuiu os galopes da égua abaixo de si, tentando controlar também a sua respiração. Ao chegarem no lugar, desceu do animal branco, ajudando Samuel com as amarras no tronco de árvore.

-Sam... -Ela deu uma leve risada, olhando tudo aquilo. Não de deboche, mais sim de surpresa. Aurora não era a garota mais romântica do mundo, e ela sabia disso. Mas também não sabia que o namorado tinha esse lado tão aflorado e, por um minuto, ela se sentiu mal por pensar que jamais faria um tipo de coisa desse. -Ficou tudo lindo.

Ela se sentou em uma das pontas da toalha, se recostando na árvore atrás de si e ao lado de Sam. Ela não podia acreditar naquilo. Realmente, era algo que parecia vir de um filme de Nicholas Sparks. Porém esses sempre tem uma catástrofe logo depois dos bons momentos.

Assentiu ao ouvir o comentário dele, e deu uma mordida no morango, se sentindo meio boba com aquilo. Pegou um muffin de queijo e tomate para si, utilizando os dedos para pegar uma porção menor e levou à boca.

-Chad realmente não é pago para isso. -A mais nova chutou o nome da única pessoa que ela sabia que o tatuado confiaria para esse tipo de coisa. Olhou para o mais velho, dando um beijo surpresa em sua bochecha, e não se afastando dali. -Obrigada pela surpresa.

Deu um selinho longo em seus lábios e se afastou dele, ficando de costas para o mesmo. Aproveitou que esse estava sentando também contra a árvore e se deitou em sua direção, apoiando a cabeça em suas coxas, antes de comer mais um pedaço do muffin.

-Eu não sabia desse seu lado romântico.

Para ela, ele falar sobre a ajuda de Chad não era algo que a surpreendia. Tinham poucas pessoas nesse mundo que Aurora sabia que Sam confiava o suficiente para se abrir desse jeito. Para se deixar vulnerável desse jeito à alguém. Suas mãos nos fios claros fez a garota fechar os olhos, o cheiro típico de natureza misturado com o café presente daquele piquenique. Então os abriu novamente, encarando o homem acima de si.

Quem diria, não é?

Seu coração acelerou levemente ao ouvir o comentário, e o sorriso tomou conta de seu rosto. Colocou o cotovelo na toalha e levantou o tronco, levando os lábios aos alheios em um beijo calmo, logo voltando a se sentar ao seu lado, dessa vez de frente para ele. Levou as mãos à nuca de Sam, brincando com os curtos fios de cabelo presentes ali.

-Eu gosto do seu estilo meio troglodita. Foi isso que me atraiu em você, para começar. -Deu uma risada, dando mais um selinho em seus lábios. -Mas achei muito fofo tudo isso. Gosto de ver que você está tentando algo que acha legal. E que eu sou tão importante para você quanto você é para mim.

Aquilo tudo realmente parecia cena de um filme. Porém, o trance foi quebrado no momento que ouviu sobre Sol. Seus olhos arregalaram, e a garota olhou rapidamente para o cavalo e de volta para ele.

-O que? -Ela sabia que Sam tinha bastante dinheiro sobrando, mas ela não sabia o que achar daquele presente. Era um cavalo. Um animal que ela amava tanto mas que por muitos anos não pode ter. -Você está falando sério?

Apesar da surpresa, o sorriso e felicidade era evidente em seu rosto. A jornalista negou com a cabeça e atacou o moreno em sua frente, se jogando em cima de seu corpo sem nenhum pudor a vista. Ela sabia que ele a seguraria. Depositou vários beijos em lugares diferentes de sua face.

-Você é um idiota, sabia disso? -Seus braços estavam entrelaçados no pescoço do maior, e ela se manteve sentada em seu colo depois do ataque. -Você não precisa me mimar com tantos presentes, vou ficar mal acostumada.

Não que ela não gostasse daquilo. Rory, todavia, sempre foi muito independente das pessoas, e se jogar em algo de cabeça como estava fazendo era algo completamente novo, e que assustava a mulher de uma maneira sem igual. Porém, em sua cabeça, não tinha ninguém que ela ia fazer isso, se não com ele.

Ela estava com as pernas esticadas, o corpo entre as dele e aproveitou o local para encostar as costas em seu tórax. Apoiou a cabeça em seu ombro, e colocou as mãos sobre os braços que a envolviam, a apertando mais enquanto ela traçava os desenhos rústicos com as pontas dos dedos.

Soltou um suspiro de alívio. Ela se sentia em casa como nunca.

-Foi total seu lado troglodita que me conquistou! A falta de paciência, a voz alta e o quase me arrastar pelos cabelos quando eu faço alguma merda.

O tom sarcástico era óbvio em sua voz, e o sorriso brincalhão era evidente em seu rosto. Ela soltou um suspiro, se arrumando no peito do maior, os dedos voltando a brincar com as tatuagens em seu braço que ela tanto adorava. Dava um ar de 'garoto problema' mesmo o homem sendo um amor de pessoa. Soltou um suspiro ao ouvir a voz em seu ouvido, juntamente com a barba que roçava pelo seu pescoço.

Se existia uma pessoa mais apaixonada em qualquer lugar do mundo, ela sabia que era mentira.

***

-Pelo amor de Ganesha, só esse cavalo deve ter custado mais que minha vida, Sam!

Deu uma risada, terminando de guardar as coisas na pequena cesta que ficaria junto com os cavalos que ela, em tão pouco tempo, já amava. Ela quis agarrá-lo ao sentir seu corpo quente saindo de contato com o seu, mas apenas fez um bico e o imitou, se levantando e se dirigindo até os animais.

Quem era ela para estragar esse dia, não é?

Montou em Sol, logo seguindo lado a lado com seu namorado. O astro que tinha o mesmo nome do cavalo abaixo de si se punha, e as cores alaranjadas e rosas tomavam conta do que mais cedo era o azul. Ela apenas assentiu, olhando o moreno e seus traços, tudo aquilo que um dia fora seu, perdeu, e cá estava na estaca zero novamente.

Desde o momento que tinham se conhecido, Samuel tinha chamado sua atenção. A noite do bar que ele tinha falado tinha sido péssima. Ela estava de saco cheio do lugar onde tinha que ficar, estava com fome e ainda tinha levado um pé da bunda da garota que estava saindo com. O tatuado chegou como um furacão no bar, como se fosse dono do local, e ela o odiava desde o início.

Mas quando os lábios tocaram os seus em um beijo de raiva, foi como se o mundo à sua volta tivesse parado. Suas costas contra a parede, as mãos na blusa regata branca a segurando como se sua vida dependesse daquilo e o corpo e cheiro do alheio em suas narinas tinha sido como se ela tivesse achado o amor de outra vida em um banheiro sujo de bar, que ficou um pouco mais visitado uma vez que trancaram a porta apenas com eles lá dentro.

-Eu te odeio.

A frase foi solta um pouco antes de chegarem às motos, e no momento que desceu do cavalo e seguiu para os veículos motorizados, não pode deixar de dar um beijo nos lábios do homem que ainda não tinha colocado o capacete. A frase era dita por ela desde aquele dia. Desde o banheiro. E ainda bem que ela tinha dito aquilo.

Esboçou um sorriso com a surpresa do alheio aos seus atos e colocou o capacete, pulando na garupa da moto e mais uma vez saíram pela estrada que, para eles, mais parecia um refúgio.