[RP FECHADA] The Sound of Music

Phoebe teve de se conter para não soltar um gritinho de pura empolgação. Não havia expressão mais sincera que a sua naquele instante; uma menina prestes a alcançar um ponto interno ainda desconhecido perante a própria pessoa. Diante de tantas pressões e sufocamentos causados por outras pessoas com quem tinha de lidar dia após dia e agora tinha uma certa visão parcial de onde vinha o problema com o bloqueio. A cantora não era o tipo de pessoa que via algum caminho no meio de pressão. Era justamente o contrário. — Não vou discordar de você. É uma boa tirada logo para começo, mas podemos puxar o finalzinho para o refrão. Não ser necessariamente o inicio do verso, mas uma segunda parte dele. O que acha disso? — havia empolgação no tom dela, que mais próxima do compositor, aproveitou para pegar uma folha posta no canto da escrivaninha um pouco atrás dele, repetindo o gesto de escrever o que já tinha cantado. Ainda que o gravador fizesse o seu trabalho, tinha um pé nas velhas tradições onde funcionava melhor com a escrita. — Espera! — comentou, dando alguns passos rápidos para o lado de fora da sala para alcançar a porta do outro lado do corredor.

Tinha ciência do conteúdo do outro lado, então não se deu o trabalho de procurar por alguém que a ajudasse a encontrar o que queria. O objeto de desejo encontrava-se em sua mão esquerda, e quando reapareceu dentro da sala onde Wyatt estava, puxou um banquinho da escrivaninha e sentou-se ao lado dele e apoiou o violão escurecido e centro numa coloração natural com flores detalhadas no braço, na perna direita, virando o braço para a esquerda, já que era destra. — Peguei as notas, então vou acompanhar você. — ela sorriu, um sorriso atípico da megera que estavam acostumados a ver. Agora, estava bastante próxima da garota doce e amante do próprio trabalho quando estava em cima de um palco. — Vamos deixar essa parte para outro momento, acabo de pensar em mais alguma coisa. Podemos repetir as notas, vou manter o ritmo, okay? — o sorriso foi se fechando na medida que a concentração lhe era imposta e novamente Phoebe manteve-se no lugar, agora esperando por Wyatt para a nova entrada.


Ao iniciar a estrofe, a voz abrandou cada palavra e os olhos claros desviaram para o homem ao lado. O “Not even the brightest sun could ever fade” fora dito quase de forma confusa, obrigando-a a dizimar a vontade de rir com a junção de ideias na flor do momento. Pixou o “fade” para contrastar aquela parte da música, gostando do resultado ao baixar o tom num curto falsete. Wyatt Beasley operava um milagre cujo poucos eram crentes de que um dia ao menos pudesse ser considerado a ocorrer. O “hell” cantado na próxima linha teve uma atribuição vinda do “Hell ya” solto por ele a poucos minutos, e ela não riu, mas sorriu para ele enquanto dava continuidade. O “me and you” teve sua parte dramatizada, com ela apontando-lhe o queixo numa pequena brincadeira.


Quase num modo automático ao agir por impulso, Phoebe emendou a parte que já havia cantado, introduzindo um “Hey” antes do que estava escrito na folha ao seu lado. O “we wrote our own story” continuou na medida do ritmo que seguia, tendo em mente que não precisava implementar tantas escalas vocais naquela parte, apenas aumentando a duração de uma palavra cantada, como acabava de fazer com o “story”. Enquanto passou para o “full of blood sweat and heartbeats” deixou de dedilhar o violão para exercer algumas batidas que formavam uma boa melodia com as notas e movia os ombros naquele ritmo. Também contrastou o tom no início das duas linhas seguintes, tendo mais uma vez a vontade de prosseguir.


Seguiu mais rápido com o “and that’s why we were legends” sem alterar o tom da voz, mais uma vez juntando com o que já estava pronto. “Loving you, baby, it….” fora interrompido por um gesto de cabeça dela ao indicar a folha para que ele pegasse as próximas palavras. Para isso, Phoebe voltou a tocar, não parando para pensar duas vezes no que deveria cantar, deixando a letra fluir. O “what everyone wondered, we’d never question” saíra tão natural que já parecia ter sido escrito e combinado para que ela usasse no arranjo instrumental que Wyatt havia criado. Puxou um pouco o “question” ao completar com mais um curto falsete. Fechou os olhos poucos instantes depois do “everyone”, incluindo o gesto na próxima linha ao cantar o “close our eyes and took on the world together. Do you remember?” As notas mantinham-se constantes nos instrumentos, e a letra parecia ter se encaixado bem naquele momento. A loira parou de tocar, um imenso sorriso aparecendo nos lábios.

Aquilo parecia algo tão… Normal. Para ela não, que sempre havia tido dificuldades, mas por todo o tempo em que se manteve ali, sem a mínima pressão, sentia como se tivesse nascido com um dom magnífico não só de cantar, mas o de cantar o que era de sua própria autoria. — Pegou? — perguntou, referindo-se ao que ainda não tinha cantado. Naquele dia, podia oficializar que já havia feito muito mais do que em todo o tempo em que começara a carreira.

O sorriso da mulher poderia iluminar o dia sem a necessidade de um sol ostentando no universo. A felicidade não era o ponto alto de seu interno, como também do externo e aquilo estava muito além de evidente. Era palpável. Phoebe Jekinson sentia-se uma verdadeira integrante do mundo country naquele instante e devia toda a glória daquela sensação a Wyatt Beasley. — Você nunca pensou em cantar? Ficaria feliz em dividir o palco com alguém tão talentoso em um dos show's mundo a fora. — e mais raro do que vê-la compondo, era vê-la tecendo um elogio. Mesmo tão simples e indireto como havia soado, ainda sim, era um.

A promessa de uma tour era apenas o começo de sua carreira, com a finalização do CD que logo seria entregue para a produtora responsável pela feitoria do álbum. Alguns hits já haviam sido analisados e apenas mais alguns eram necessários para fechar o novo acordo, onde Leon Russel bravamente lutava pelo novo império ao ressurgir com uma cantora country pop. Anotou todas as coisas cantadas na flor do momento, apoiando um dos braços sobre o violão enquanto o observava. — Obrigada. — agradeceu a ele, prometendo que não deixaria nada atrapalhar o humor que se manifestou dentro daquela sala. Pelo menos enquanto ainda estivesse dentro dela. Porta a fora, voltaria a por a máscara de megera cruel e promissora diva a quem todos conheciam bem ali dentro.

Uma mensagem fora enviada para seu celular, e quando o pegou para realizar a checagem, sentiu o sangue ferver por baixo das veias. "Termine o que está fazendo e venha até mim." O recado por trás da mensagem era muito claro, não precisava ler duas vezes para saber o que aquilo queria dizer, e lá se ia a promessa de manter intacto o bom humor. Saltou do banco, soltando o violão de qualquer jeito sobre o chão. — Eu preciso ir agora. — A expressão fechou-se repentinamente, e os olhos claros eram tão similares a uma tempestade que chegavam a mudar para uma coloração cada vez mais clara. — Entrarão em contato com você muito em breve. — aquilo sempre acontecia. Perguntariam a conduta da artista, o desempenho dado pelo esforço e o resultado final. Já havia lidado com aquilo outras vezes, passando-se por uma barata compositora e uma inútil naquele sentido. Alguns compositores mentiam, quase todos, em suma verdade.

Quantas vezes já não haviam roubado o pouco que tinha escrito e usado em trabalhos para outras gravadoras? Não tinha como tomar posse autoral dos pedaços, uma vez que sua fama ia de mal a pior na praça. Restava esperar por mais um sermão e ameaças de quebra de contrato caso não surtisse numa melhora ágil. Pegou o caderno e nem olhou para trás enquanto ia embora.

Em todo o caminho para encontrar Leon, treinou expressões de desejo e frases usuais que sabia muito bem causar o efeito que ele queria sentir no instante em que estavam juntos, onde servia somente de ponte para o ápice de um imperador. Uma peça descartável que nada poderia fazer para mudar isso. E no fundo, sentia-se tremendamente pior que ele por ver uma oportunidade naquela situação. Doava parte de si para ele em troca da fama, então não tinha do que reclamar, tinha?