[RP FECHADA] You better keep up

Aquela era a sua primeira noite em Nashville depois de muuuuuuito tempo.

Ao invés de aproveitar com grande estilo junto dos amigos, Alyssa optou por um tranquilo e solitário jantar no Marvin, um de seus restaurantes favoritos de toda a cidade. Se bem que... Quando tratava-se de comida, digamos que a menina não se continha da maneira que as medidas mandavam. Na verdade, Alyssa deveria jogar as mãos para o céu e agradecê-lo porque a genética tinha sido extremamente generosa. Sua irmã era um belo exemplo do quanto as mulheres da família Lansbury possuíam a árvore genealógica como aliada, considerando a fileira de figuras marcantes e incrivelmente bonitas da linhagem. Entretanto, o diferencial não se resumia em rostos angulares e corpos esguios... Ser uma Lansbury era sinônimo de talento.

Algo que Alyssa ostentava de sobra, embora esteja subindo um degrau de cada vez.

Uma deliciosa crescente, mon amour.

Recentemente, ela estreou na Broadway, como protagonista de um clássico musical.

O Fantasma da Ópera.

Uma longa e árdua temporada... e agora, depois de tanto tempo, ela finalmente poderia voltar para casa e tirar algumas semanas de férias.

Já estava inserida nesse meio da fama graças à Leona, uma modelo de elite, cujos trabalhos eram disputados pelos maiores empresários e estilistas do mundo. Claro que orgulhava-se da irmã, porém devido ao trabalho de ambas, raras se transformaram as ocasiões em que desfrutavam da companhia uma da outra por mais de três horas. Esperava sinceramente que esse cenário mudasse nos próximos dias. Mas enfim... independente de evitar, o fato de ser a irmãzinha da srta. Lansbury contribuiu para a carreira, todavia, foi a voz diferenciada que sustentou o sucesso. Alyssa alcançava uma potência que muitas cantoras experientes simplesmente não conseguiam e havia o charme particular da jovem que encantava os críticos e telespectadores de modo instantâneo.

Não existiam dúvidas que assumiu o posto de "queridinha".

E na época em que ela e Thierry Deveraux, o Erik, começaram a namorar... O estouro só não se revelou mais agressivo do que o motivo do término... motivo que ninguém descobriu até hoje, meses depois da declaração de Alyssa anunciando a separação.

Que, aparentemente, não guardou sequelas.

O motorista contratado por uma empresa de confiança a esperava na frente do hotel. Para grandes eventos, Aly contava com uma equipe numerosa de seguranças, porém... Jared cumpria perfeitamente o papel de protetor diário. Durante o caminho ao restaurante, trocaram poucas palavras, pois a concentração da atriz achava-se perdida entre as ruas que lhe traziam lembranças nostálgicas de um passado distante... e outro nem tanto assim.

Para a surpresa de Alyssa, o restaurante estava lotado. O suspiro escapou dos lábios carnudos conforme acenava um "bye, bye" para a paz.

Antes de chegar na recepção, o maître a fitou de um jeito... constrangido? Aquilo a confundiu e até virou a cabeça, checando se era com ela mesma, mas o "bonsoir, mademoiselle Lansbury" confirmou qualquer suspeita.

- Olá, Antoine... Aconteceu alguma coisa, cher?

Devagar, observou a moça ao seu lado e de perfil... reconheceu o rosto, só não recordava-se de onde. O que era praticamente um crime! Por um breve momento, Alyssa demorou a atenção nos traços delicados e sérios da face feminina...

Buscando arquivos de referência na memória extensa.

- Senhoritas, adianto minhas sinceras desculpas, porém, infelizmente, aconteceu um problema com a reserva das duas - o homem disfarçava o nervosismo, mas o gesto constante de arrumar a gravata indicava o desconforto... Alguém que tem a perfeição como característica, abominava erros, ainda mais os amadores - Há apenas uma mesa disponível no restaurante e ela carrega os nomes de Alyssa Lansbury e Kayla La Blanco.

Aguardava as reações das damas com extremo pesar, por isso... quando Alyssa liberou uma sonora gargalhada, a qual tentou abafar contra a pequena Louis Vuitton, Antoine a encarou, espantado, porém a loura balançou a mão livre de modo charmoso - Oh, sinto muitíssimo... Mas acabo de pensar em algo extremamente aleatório - ainda carregava vestígios do risinho sobre a boca pintada de um tom que beirava a um nude-rosé - Nossos nomes tem a mesma distribuição de sílabas... e, falando para vocês, soa um absurdo... Desculpem-me.

Alyssa revirou os olhos.

- Então... Voltemos ao problema. Como iremos resolvê-lo, afinal?

Kayla, note que a pergunta não foi para o maître.

Foi para você.

O reconhecimento do maître em relação à Alyssa não vinha da fama adquirida nos últimos meses, mas sim de anos frequentando o lugar, seja com a família ou amigos, e até sozinha, já que não se preocupava com a opinião de terceiros de como levava a própria vida. Ela adorava o ambiente requintado e embora não tenha traços esnobes no comportamento, Alyssa gostava do glamour, do requinte e, principalmente, da maneira que a champanhe sempre parecia dançar no interior de uma delicada taça. Mesmo que transmita uma personalidade acesa e completamente ligada nas voltagens mais perigosas, ela também era dona de nuances observadoras e perfeccionistas. Não tratava-se de uma habilidade digna de sorte o fato de uma leitura ser o suficiente para gravar cada palavrinha dos textos. Antes de escolher a carreira de atriz, Alyssa pensou em cursar Medicina, mas desistiu na mesma semana da matrícula.

Sentia-se bem entre os livros...

Mas era o palco que preenchia seu coração.

A sensação cega das luzes piscando segundos que antecedem o primeiro contato com o público...

Aquele segundinho liberava uma dose exagerada de endorfina... e, de repente, Aly enxergava a vida correr nas veias.

O verdadeiro significado do prazer.

Alyssa era um pássaro solto, que voa alto e nas asas esbeltas, o sol costuma refletir seus raios, tornando-a irreal aos simples mortais. E olhe bem, Kay... Pelo cantinho das pálpebras, com a sobrancelha imponentemente arqueada... detalhes, somente detalhes diante do conjunto. Ela não transmitia qualquer centelha de incômodo, pois estava para nascer criatura capaz de intimidá-la ou fazê-la sequer ruborizar. Na verdade, em resposta, a loura desenhou um sorriso meigo na comissura da boca, mas o olhar queimava como mil Infernos.

Não foi com a intenção de provocar...

Era natural da atriz.

A máscara que usava dia após dia.

Tão clichê, certo?

Mas nem todas as melhores histórias são inteiramente originais.

Enfim...

Enquanto esperava a resolução do problema, dividia minuciosos olhares entre Antoine e a srta. La Blanco, que expunha a face talhada no mais frio mármore. A modelo perguntava sobre uma presença específica e dando privacidade aos dois, Alyssa pegou o celular dentro da bolsa e verificava algumas mensagens, mas sem respondê-las. Por um breve instante, uma sombra de impaciência atravessou a expressão de linhas felinas, porém foi realmente rápido. Após guardar o aparelho... a compostura retornava conforme os glóbulos azuis fitavam Kayla perante a sugestão. Entretanto, a morena afastou-se para recepcionar uma linda moça... ninguém menos que a dona do restaurante, Caroline Cosgrove. O diálogo da dupla de beldades indicava uma notória intimidade e devido a etiqueta, Alyssa não ficou encarando a interação.

- Ora, Antoine... Pare com isso, pelo amor de Deus – revirou as orbes e expôs um pequeno sorrisinho em seguida – Ou vou começar a pensar nas coisas mais loucas, como por exemplo... que pedirá para que coloquem sal no meu petit gâteau.

O homem estava próximo de se enforcar com a gravata e Alyssa não melhorava a situação. E ela sabia perfeitamente bem que o efeito beirava o cruel, mas apreciava vê-lo assim, tão desconcertado – Mademoiselle, por favor... – sussurrou em tom desesperado e recebeu um balançar dos ombros como resposta.

Se Kayla e Caroline eram grandes amigas, o maître francês e a caçula dos Lansbury possuíam certo grau de camaradagem.

Quando as duas se aproximaram, Alyssa já as recebia de maneira simpática – Agradeço a atenção, srta. Cosgrove... – assim concluiu por conta da ausência de uma aliança - Eu compreendo o equívoco da situação. Tem um restaurante adorável e diferenciado... E claro que é uma honra finalmente conhecê-la – depois dos últimos acertos, despediu-se da empresária. Então... Kayla a encarava e lançou a súbita pergunta. Que direta, não? Pendeu a cabeça de forma suave para o lado, ponderando. Tinha fortes dúvidas se a modelo seria ou não uma companhia agradável... mas, de fato, extremamente divertida. Alyssa estalou a língua no céu da boca antes de mover a mão para que Kayla passasse adiante – Estou logo atrás da senhorita – decretou.  

Se algum pensamento atravessava a mente de Kayla, Alyssa não teria como adivinhar, pois a modelo parecia um livro trancado por uma combinação exagerada de códigos. E aquilo funcionava como as leis inevitáveis da física... O difícil tende a atrair. O difícil sempre brilha mais... O difícil excita, e não em termos exatamente sexuais. Quando Kayla passou na sua frente, esperou um tempinho antes de segui-la. Antoine terminava de recolher o seu sobretudo para deixá-la mais confortável, ajudando-a com as mangas complicadas. A pequena distância permitiu uma melhor análise de como o ambiente reagia à Kayla... Apesar dos modos contidos, a morena cintilava feito um diamante. Bem, o acaso, certamente, tinha modos bastantes... específicos... de agir. Não demorou a acompanhá-la, e sim... cada passada de pernas roubava o equilíbrio do lugar porque era possível contar a quantidade de olhares que não se atreveram a encará-la desfilar no corredor entre as mesas.

Zero.

Para não cometer outra gafe, Antoine adiantou-se em mostrá-las o lugar reservado, e este ficava num dos cantos mais reservados do restaurante. A música suave criava uma atmosfera tranquila e era baixa o suficiente para não atrapalhar as conversas paralelas. Diante de Kayla, a loura sentou-se e sorriu para o maître antes dele ser substituído por uma moça.

Kayla era direta.

Tal traço ficava evidente em sua forma de falar e de se comportar.

Conhecia cada item da cartilha, mas conforme ela escorregava as safiras sobre a lista, notou convidativas novidades. Entretanto... quando a srta. La Blanco fez o seu pedido por uma das melhores safras do estabelecimento, Aly estendeu a carta para Rowan, perdendo o interesse na busca... – Nenhuma exigência. Irei dividir a garrafa com a minha nova amiga... e, por favor, para a entrada, vou querer, hmmm... ah, sim... foie gras de pato com chutney e torradas – lançou um último sorriso para a garçonete, e só então encarou Kayla à medida que descansava as mãos sobre o colo. Todavia... assim que os olhos negros a fitaram, ela sentiu um calor subir pelo pescoço e o mesmo esquentou os pontos atrás das orelhas.

Tratavam-se de duas valiosas pedras de ônix.

Negros como as penas de um corvo.

Era difícil distinguir as íris das pupilas.

Talvez... olhando de mais perto...

- Acredito que será um prazer compartilhado, srta. La Blanco.

Em resposta, estendeu a mão que ostentava poucos anéis, e Kayla sentiria o contraste frio das joias e da textura macia e quente da palma assim que os dedos fecharam-se ao redor da sua, apertando-a em um toque firme, porém delicado – Alyssa Lansbury.

Alcançamos um dilema.

Se você é o diabo personificado... Alyssa pode ser definida como o capeta encarnado nos traços quase angelicais.

Vamos ver qual Inferno entrará em combustão primeiro, K.

- Eu sei quem você é... Ao menos, o que a mídia revela. E partindo desse princípio, na verdade, não conheço nada.

Afinal...

Revistas e sites de fofocas... tsc.

Indignos de comentários, e na maior parte das vezes, de créditos.

- O que deseja saber?    

Caso Alyssa tenha percebido ou não o detalhe da garrafa ser um item de estimação, não ficou transparente nas feições sempre tão risonhas e com aquele teor implicante de quem gosta de tirar os outros do sério, atravessando os limites, mas sem inconveniências desnecessárias. Porque não era qualquer criatura a despertar o interesse da Lansbury, que desde pequenininha, mostrava-se absurdamente seletiva. Nas roupas, nos pertences e, em principal, nas pessoas. Ela sabia o preço de uma escolha errada... e não era todos que conseguiam pagar. Até hoje, carregava dúvidas se foi capaz de arcar com as consequências. De toda a forma, aquele momento mostrava-se inadequado para determinados tipos de lembranças.

Ainda aguardava a resposta.

E Kayla não a decepcionou.

Para sua genuína surpresa, a sombra de um sorriso ergueu as comissuras dos lábios atraentes, convidando-a a observar detalhadamente o movimento que configurava o sorrisinho discreto. Alyssa umedeceu os próprios conforme se aproximava mais, imitando-a ao apoiar os cotovelos na mesa e o queixo nas mãos delicadas e de compridas unhas vermelhas. Enquanto as orbes de Aly retratam um belo dia de sol, as de Kayla compõem o ápice de um céu noturno e ausente de estrelas. Uma escuridão que traga, engole... Como cair do precipício e distante de qualquer certeza se sobreviverá ao absoluto impacto. Mas a atriz podia apostar cada ficha que o prazer que sentiria durante a queda... Ah, ela era uma criatura de extremos, e não tinha medo de arriscar.

O que perderia, afinal?

O que mais poderia perder?

Notava o olhar infiltrar-se na derme, atravessando as barreiras até tocá-la em lugares inimagináveis. E a réplica se encontrava no desafio azul celeste... Achou alguma coisa, Kayla? Olhou todos os cantinhos, ângulos e arestas? Pois bem... Pela primeira vez na sua vida, o “nada” não será um resultado ruim.

Mas... instigante.

Como quem cospe gasolina nas fagulhas.

“Quem é Alyssa Lansbury?”

- Talvez, e só talvez, você descubra até o fim da noite, Srtª. La Blanco, mas... – ela mexeu o nariz de um jeito engraçado conforme o projetava a boca num beicinho cheio de dengo – Aposto que não conseguirá – voltou a se ajeitar na cadeira confortável, encostando as costas contra o encosto do assento – Ora... Qual seria a graça se as respostas caíssem em nossos colos? Não, não, não... Assim como espero merecer pedaços seus para desvendar o quebra-cabeça, também quero que faça por onde, minha cara.

Nesse instante, Rowan retornava com a garrafa de vinho. O processo de colocar as taças, deslizar a bebida escura no interior do cristal... tudo ocorria sem que as duas desviassem a atenção uma da outra, e a tensão se mostrava sólida feito as presenças desestabilizadoras. As pontas dos dedos seguravam a haste da louça e Alyssa aspirou o suave aroma que apesar da ironia da definição, dialogava com o nome marcante.

Domaine.

Uma ameaça guardada dentro de um belo frasco.

- Sinceramente, espero também, pois nenhum vinho jamais me conquistou a atenção...

Arqueou a sobrancelha e tocou a taça de Kayla com a sua, brindando, mas sem invocar o motivo.

Por trás desta, o sorriso de Alyssa se expandiu.

E só então a bebida deslizou da língua para a garganta...